A BÍBLIA E O DINHEIRO
O cristão que vive em uma sociedade capitalista tem benefícios e está exposto a perigos sutis. O capitalismo está arraigado (i) no mercado, (ii) no espírito de luta e (iii) no capital; o foco é a maximização das riquezas. Duas posições opostas se destacam.
Teologia da Mendicância. A teologia da mendicância ensina: (i) o crente deve se preocupar só com a dimensão espiritual da vida, (ii) o dinheiro tem só uma face sombria e deve ser rejeitado, (iii) a miséria é sinônimo de espiritualidade autêntica.
Teologia da Prosperidade. A teologia da prosperidade afirma: (i) o crente é herdeiro de Deus e deve ser rico, saudável e feliz, (ii) o dinheiro tem só face luminosa e deve ser buscado com afinco, (iii) a prosperidade é a credencial de espiritualidade.
Teoria da Neutralidade do Dinheiro. Há quem creia que o dinheiro seja neutro. Cunningham e Rogers (1993, p. 47-50) avaliam que o dinheiro em si mesmo não é maligno. Howard Dayton (2002, p. 164,165) afirma que o dinheiro é moralmente neutro. John Haggai (1990, p. 166) esclarece que o dinheiro e a matéria não são bons nem maus em si mesmos. Em síntese, o dinheiro, para muitos, não seria bom e nem ruim, mas apenas uma ferramenta cuja bênção ou maldição depende de como a pessoa irá utilizá-lo.
Teoria da Divindade do Dinheiro. Outros pensam diferente. Para Osmar Ludovico (2007, p.186), Jesus dá nome ao dinheiro (Mamom), logo é assunto material, moral, econômico e espiritual. Jesus, para Jacques Ellul (2008, p. 77-80), personifica e considera o dinheiro como divindade, poder que age por si e que tem valor espiritual (Mt 6.24; Lc 16.13). Richard Foster (2005, p. 41) diz: o dinheiro é um agente ativo e inspira devoção. Para Ogden (2010, p. 261), ele pode reivindicar devoção e levar à idolatria (Mt 6.24).
Equilíbrio: Teologia Bíblica da Prosperidade. É necessário ensinar sobre prosperidade bíblica na igreja sem cair nesses extremos. É possível, na vida, ter sem ser, ser sem ter, não ter nem ser, ter e ser. O ideal é que o discípulo de Cristo concilie prosperidade e espiritualidade, fé e finanças. A Bíblia ensina princípios úteis sobre como obter prosperidade de maneira lícita, administrar sabiamente as posses e investir em causas nobres e negócios rentáveis.
O discípulo de Cristo deve encontrar o ponto de equilíbrio. Não pode ser dominado pelo dinheiro. Mas, sem dinheiro, a família não paga a moradia, nem água, nem energia elétrica, nem telefonia, nem alimentos, nem vestes, nem calçados, nem educação de qualidade, nem transporte, nem lazer, nem assistência médica, nem ajuda o próximo (CHAGAS, 2011).
José Gonçalves (2011) esclarece que o hebraico possui alguns vocábulos para prosperidade, riquezas ou bens; o termo tsalach tem o sentido de viver em prosperidade (Gn 39.2; Js 1.8; SI 1.3). Porém, acima do valor do que bens materiais, estão: conhecimento (Pv 3.13; 20.15), a integridade (SI 7.8; 78.72), a justiça (SI 15.2; Pv 8.18; 14.34), o entendimento (Pv 15.32; 19.8), a humildade e a paz (Pv 15.33; 18.12; 12.20).
Fonte: CHAGAS, J. R. O. Curso de Discipulado: princípios para uma vida abundante. Campo Grande: Didasko, 2021.
O CRISTÃO PODE CRESCER FINANCEIRAMENTE?
Que o dinheiro tem uma dimensão /religiosa espiritual e pode se tornar o agente de dominação da criatura humana, não há dúvida. Mas ele pode também ser usado para a glória de Deus?
Essa indagação nos leva a alguns pontos relevantes: 1) qual é motivação correta para se obter dinheiro?; 2) quais são os meios legítimos da Economia de Deus para “ganhá-lo”? 3) quais são os fins/destinatário que o cristão deve dar ao vil metal para neutralizar sua dominação e honrar a Deus?
Há, porém, um fator que antecede a abordagem dessas questões. Motivação, meios e fins se tornam essenciais desde que seja superado o conceito dualista da realidade gnóstico-maniqueísta que define a dimensão da materialidade como intrinsecamente má e a imaterialidade como intrinsecamente boa. A doutrina da criação é taxativa: não havia nada de mau na criação original. Logo, o cristão não deve jamais repudiar a importante dimensão material da vida.
O projeto de vida do cristão deve ser integral, ou seja, conciliar as duas dimensões da existência. Valorizar o aspecto espiritual, mas sem menosprezar o material, afinal, na maior parte do planeta, o povo vive sob um sistema econômico no qual quase tudo tem preço e que, provavelmente, o fator que mais limita o padrão de vida de um indivíduo, cristão ou não, é o montante de sua renda. E a renda, para ser suficiente, depende de outros fatores, conforme veremos adiante.
Pode um discípulo de Cristo ser próspero materialmente?
Paulo Romeiro ponderou que à luz das Escrituras, não é errado o cristão procurar enriquecer ou buscar a prosperidade econômico-financeira; deve-se mesmo orar pelo pão de cada dia, por um emprego melhor, por uma casa e um carro melhores e várias outras coisas que são bênçãos que acompanham a salvação; tudo isso é válido. Entretanto, o dinheiro pode ser um ótimo empregado, mas nunca será um bom patrão. Se o cristão souber controlar ou administrar, com sabedoria e equilíbrio, o dinheiro que lhe chegar às mãos, vai ser uma bênção.
Alan Pieratt, ao denunciar erros crassos da TP, exorta que a igreja não deve cair no erro de dizer que a pobreza é boa em si mesma e que, de alguma forma, traz até nós a graça de Deus; no passado, esse foi o erro do monasticismo. Finalmente conclui que na cosmovisão da Bíblia, nem pobreza nem prosperidade são virtudes, mas, entre as duas, um acesso relativo à prosperidade constitui o ideal bíblico.
Observa ainda que a prosperidade contra a qual a Bíblia prega é o acúmulo de bens que vem com a riqueza e que engana a mente e a alma, fazendo com que se sintam autossuficientes, pensando que não devem nada a Deus ou aos homens.
Ademais, a prosperidade é um bem, se for concebida no sentido de uma vida ordeira e decente, sem preocupação excessiva com o pagamento de contas, com consumo e com educação, em que sobra o necessário para ajudar o próximo. Warren W. Wiersbe arremata: a Bíblia não desestimula a aquisição de bens, exceto por meio ou para fins ilegais.
CHAGAS, José Roberto O. Manual de teologia econômica. Campo Grande: Kenosis, 2011